Acusado de mandar matar prefeito é condenado

Demorou quase duas décadas para que o acusado de ser o mandante do assassinato do então prefeito de Igarapava, Gilberto Soares dos Santos, o “Giriri”, prestasse contas com a Justiça. Demorou dez horas para que o julgamento, realizado ontem no Fórum de Franca, fosse concluído. A Justiça tardou, mas, para os familiares da vítima, não falhou. Sérgio Augusto Freitas, o “Serginho”, foi considerado culpado por homicídio triplamente qualificado e condenado a 30 anos de reclusão em regime fechado. Ele está preso desde julho do ano passado por outro crime: é acusado pelo Gaeco de envolvimento com organização criminosa que se uniu para fraudar licitações na Prefeitura.

O julgamento começou às 9 horas. Já passava das 19 horas, quando o juiz Lúcio Alberto Enéas da Silva Ferreira, o mesmo que também atua na Operação Sevandija, em Ribeirão Preto, anunciou a sentença. Familiares de Giriri, entre eles, a viúva e quatro filhas, deram as mãos. Aplaudiram a condenação. A filha Rubiana Santos atuou como auxiliar de acusação.
O plenário ficou lotado o dia todo. A plateia assistiu a uma batalha entre acusação e defesa. “O Sérgio foi o principal mandante do crime. Temos provas de sobra. Ele vai pagar por tudo o que fez. E não foi pouca coisa. Ele está envolvido em crimes gravíssimos e só vai parar se ficar preso”, disse o promotor Adriano Mellega.
Sergei Cobra Arbex, responsável pela defesa do acusado, disse que o MP tem “paixão acusatória”. “Acabamos de assistir a um espetáculo deprimente. Estamos diante de uma grande mentira. Não há sequer indícios de que o Sérgio tem envolvimento com este crime. Não há nenhuma prova. Se o Sérgio tem problemas na administração pública, é uma coisa. Daí a dizer que mandou matar tem uma distância muito grande. Ele não é assassino.”
Serginho escapou da acusação de sequestro e cárcere privado, mas foi condenado por homicídio triplamente qualificado. “Não existe a menor possibilidade de afastar a culpa. Ele foi o principal mandante do crime”, afirmou o promotor Adriano Mellega. A defesa anunciou que vai recorrer da decisão.
O crime aconteceu em outubro de 1998, quando o prefeito exercia o segundo mandato. Giriri estava em sua chácara com a família, quando foi sequestrado por cinco homens. Seu corpo foi localizado no dia seguinte, com 11 perfurações de bala e sinais de agressão. A morte do prefeito teria sido encomendada por um grupo de antigos aliados políticos por supostos acordos não cumpridos. Dos 13 denunciados, nove foram condenados. Serginho, que era o vice-prefeito e assumiu a Prefeitura com a morte de Giriri, foi o último a ser julgado.
‘Sensação de frustração máxima’
Considerado um dos principais criminalistas do País, o advogado Sergei Cobra Arbex foi o responsável pela defesa de Sérgio Augusto Freitas, o “Serginho”. Ele alegou que a motivação do crime teria sido uma dívida que Gilberto Soares dos Santos, o “Giriri”, tinha com os autores do assassinato e que seu cliente não teve nenhuma participação.
O defensor não concordou com o resultado do julgamento. “É uma sensação de frustração máxima. Não pela pena em si, que é absurda, não existe esta pena que foi fixada em patamares que não existem, mas não era para ser condenado mesmo. Quem assistiu ao plenário viu que não há provas. Razão pela qual vamos recorrer, sustentando que os jurados erraram.”
Gilmara Natália dos Santos tinha 13 anos quando viu o pai ser sequestrado de casa e morto. O tempo passou, ela se tornou delegada de polícia e veio a Franca prestar depoimento.
O que representa este dia?
É doloroso, mas é o momento pelo qual todos esperávamos há muito tempo. Desde o dia do crime, a gente queria ver este sujeito sentado no banco dos réus, sendo julgado e condenado.
Como foi ter prestado depoimento olhando para o homem que é acusado de ter mandado matar o seu pai?
É triste reviver tudo, falar novamente coisas que você achava que pudesse ter esquecido ou sentido menos, mas era um momento que a gente sempre esperou. Convivi com este senhor na cidade que eu morei por muitos anos. Ele frequentava os mesmos lugares que eu. Sempre me encarou nos olhos, sempre com certa arrogância. Eu, sem o meu o pai, e ele, vivendo a vida dele. Hoje, está ali sentado, sendo julgado e olhando com a mesma arrogância, por incrível que pareça.
O que você se lembra?
Eu estava assistindo à televisão com o meu pai. Estava meio sonolenta e olhei para o chão e vi pegadas de pés sujo de terra. Do nada, eles já começaram a agredir o meu pai. Trouxeram os meus irmãos e minha mãe para a sala. Tinha sangue pelo chão, quebraram os telefones, começaram a ameaçar todo mundo. Teve um disparo de arma de fogo. Eu fui amarrada. Me lembro do odor alcoólico de quem vinha atrás de mim, ele estava com cheiro de cerveja. Sempre batendo muito no meu pai. Eles queriam levar um dos meus irmãos, mas não levaram. Nos trancaram no banheiro, falaram para minha mãe, deram a palavra de bandido, de que não iria acontecer nada com o meu pai. Não deixaram ele colocar roupa. Eu me lembro direitinho. Ele falou: “Posso colocar uma roupa?”, sempre muito humilde. Eles falaram: “Não, não precisa”. Eles saíram com meu pai e nos trancaram no banheiro. Certo tempo depois, conseguimos quebrar a porta e fomos chamar minha tia, que morava próximo. Saímos procurando pelo meu pai na cidade até que em um determinado momento, de madrugada, ficamos sabendo o que tinha acontecido. Eu era muito grudada com meu pai. Achei que fosse morrer sem ele.
Como foi ouvir a sentença?
Foi um alívio. A dor não passará nunca, mas a condenação ajuda a gente a ficar em paz. Sou uma nova pessoa após a condenação. Acho que todos nós vamos seguir sem um peso na nossa vida. A sensação de impunidade findou hoje.
Fonte: www.gcn.net.br