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Com elementos e linguagem que remetem ao universo infantil, o músico Chico Buarque de Hollanda escreveu, em 1977, a célebre canção “João e Maria”, que teve letra gravada em cima de uma melodia composta por Sivuca e participação da cantora Nara Leão.
Com linguagem extremamente poética, a música narra o fim de um relacionamento, visto pelos olhos puros de uma criança. Fala a respeito de atos de heroísmo, do amor e da dolorosa separação do casal.
É mais uma das canções que abordam o fim de um ciclo, que antes era motivo de imensa felicidade. Porém, ao fazer isso por meio do universo infantil, Chico Buarque mais uma vez se mostrou genial. Provou que não há um modo correto ou único para falar de saudade. Mostrou que a pureza enxergada pelas crianças muito tem a ver com o amor.
Cada palavra escolhida é repleta de significados, e mostra aquilo que Antoine de Saint-Exupéry já havia abordado mais de 30 anos antes, quando escreveu O Pequeno Príncipe: a pureza das crianças tem muito a nos ensinar.
Assim como o livro de Saint-Exupéry, a canção de Chico Buarque pode até reunir elementos do universo infantil, mas de forma alguma é uma obra feita exclusivamente para as crianças. Toda essa poesia e sensibilidade têm muito a ensinar aos corações duros e cansados dos adultos, que muitas vezes, por inúmeros fatores, se quebram e nunca mais voltam a ser tão puros.
Outra vertente a respeito de “João e Maria” diz que é uma canção-protesto contra a Ditadura Militar, que ainda estava implantada no país em 1977, embora os anos mais rígidos já tivessem passado.
Segundo os defensores desta teoria, alguns elementos que demonstram isso estão em versos como “Era uma noite que não tem mais fim”, se referindo ao período obscuro pelo qual o país atravessava, e “Pois você sumiu no mundo/Sem me avisar/E agora eu era um louco a perguntar/O que é que a vida vai fazer de mim”, que pode se referir ao desaparecimento da liberdade devido ao regime ditatorial ou aos amigos de Chico Buarque que haviam sido exilados por fazerem oposição à ditadura.

Bruno da Silva Inácio é jornalista da Tribuna de Ituverava, especialista em Gestão Cultural, Literatura Contemporânea e em Cultura e Literatura. Cursa pós-graduação em Filosofia e Direitos Humanos e em Política e Sociedade. É autor dos livros “Gula, Ira e Todo o Resto”, “Coincidências Arquitetadas” e “Devaneios e alucinações”, além de ter participado de diversas obras impressas e digitais. É colaborador dos sites Obvious e Superela e responsável pela página “O mundo na minha xícara de café”.