“Pequena coreografia do adeus”, deAline Bei: medos, desejos e sonhos

A escritora Aline Bei

“Pequena coreografia do adeus”, segundo livro de Aline Bei, é uma obra sensível, capaz de tocar em muitas feridas da vida cotidiana, especialmente aquelas que pareciam esquecidas num primeiro momento.
Assim como fez em “O peso do pássaro morto” (vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura), a autora utiliza uma estrutura narrativa própria, em que a prosa poética dá voz a personagens fortes e muito bem construídas.
Em “Pequena coreografia do adeus”, a personagem-narradora é Júlia, uma jovem escritora que deseja se entender com os muitos traumas vivenciados durante a infância, a maioria deles provocados pela relação conturbada de seus pais.
Tímida e solitária, ela busca encarar o passado para viver melhor no presente e, ao mesmo tempo, amadurecer sua escrita e se entregar a outras manifestações artísticas.
A narrativa é repleta de movimento. Caminha entre passado e presente, revisita as relações familiares e evidencia o papel desempenhado pela infância em tudo que se segue a esse período da vida.
Reflexões
Provoca reflexões a respeito do quanto é subjetivo o momento que põe fim à infância e aborda questões relativas às mais diversas formas de violência, mesmo aquelas praticadas “sem querer”.
As frases curtas adotadas por Aline Bei constroem um estilo literário próprio sem que isso cause qualquer prejuízo à construção psicológica dos personagens. Júlia, por exemplo, reflete sobre medos, desejos e sonhos de maneira sensível e convincente. Carrega culpas que não são suas e, pouco a pouco, encontra o seu lugar em sua própria história.
Mais uma vez, Aline Bei toca em temas que machucam e expõem uma sociedade um tanto quanto disfuncional. Júlia, no entanto, é mais uma voz que, apesar de todas as feridas, se impõe.
“Pequena coreografia do adeus” é um livro desafiador, não só pelos temas, mas por exigir um olhar para dentro. Sair ileso da história de Júlia ou da escrita envolvente de Aline Bei não é uma opção aqui.

Bruno da Silva Inácio é jornalista, mestre em Comunicação e pós-graduado em Literatura Contemporânea, Política e Sociedade e Cultura e Literatura. Atualmente cursa quatro especializações (Cinema, Teoria Psicanalítica, Antropologia e Gestão da Comunicação) e reside em Uberlândia, onde trabalha como assessor de imprensa da Prefeitura.
É autor dos livros “Gula, Ira e Todo o Resto” e “Devaneios e alucinações”, participante de outras quinze obras literárias e colaborador da Tribuna de Ituverava e dos sites Obvious, Provocações Filosóficas e Tenho Mais Discos que Amigos.
Também manteve, entre 2015 e 2019, a página “O mundo na minha xícara de café”, que chegou a contar com 250 mil seguidores no Facebook.