Concessão do Direito Real de Uso de Laje e Direito de Imissão Provisória de Posse

Amanda Andrade Souza
Ana Júlia Oliveira Marques
Brenda Santos Oliveira Sousa
Carlos Eduardo Rezende Araújo
Eduarda Barbosa De Oliveira
Fernanda Henrique de Oliveira
Paola Cristina dos Santos Silva

Introdução

A introdução do direito de laje na legislação brasileira, por meio da Lei nº 13.465/2017, busca enfrentar os desafios da regularização fundiária urbana e rural. Esse instituto, embora represente um avanço, é muitas vezes visto como uma solução temporária diante de um cenário habitacional complexo. A possibilidade de registrar construções sobrepostas ou infrapostas como unidades autônomas confere aos titulares um direito formal sobre o espaço aéreo ou subsolo, oferecendo maior segurança jurídica. O direito de laje, como uma modalidade do Direito Real de Uso de Laje, também se insere nesse contexto de busca por soluções habitacionais em áreas urbanas adensadas e de baixa renda.

A Concessão do Direito Real de Uso de Laje é uma modalidade específica do Direito Real de Superfície, voltada para situações urbanas em que uma construção, geralmente em áreas de baixa renda e de uso consolidado, é feita sobre outra edificação preexistente. Este instituto permite que o proprietário de uma construção ceda o direito de construir e utilizar o espaço acima de sua edificação, oferecendo segurança jurídica para moradores e possibilitando o desenvolvimento sustentável de moradias. Essa concessão visa promover a regularização fundiária, conferindo titularidade e dignidade às famílias que residem em moradias autoconstruídas sobre outras edificações.

Por meio do art. 1.510-A do Código Civil, o legislador busca estabelecer uma norma que reconheça as condições urbanísticas e o adensamento das construções em áreas populares, proporcionando diretrizes para uma ocupação formalizada e ordenada. No entanto, a norma, repleta de referências a outras legislações, torna-se complexa para interpretação e aplicação prática. A eficácia registral do direito de laje também é questionada, considerando que muitas edificações beneficiáveis estão em áreas com obstáculos à regularização, como favelas e regiões sem infraestrutura adequada.

Desenvolvimento

A aplicação da norma representa um desafio ao sistema registral, pois exige a criação de um condomínio sobre unidades sobrepostas, dispensando a fração ideal do terreno, o que se distancia do conceito tradicional de condomínio no Código Civil. O direito de laje, portanto, busca atender a uma demanda prática, mas ao custo de adaptar a teoria dos direitos reais para uma situação em que o ideal seria a implementação de políticas habitacionais estruturantes e não apenas legislativas. Nesse sentido, as políticas públicas habitacionais deveriam ir além da regulamentação do direito de laje, buscando uma efetiva regularização fundiária e uma urbanização inclusiva que beneficie todas as camadas sociais, não apenas formalizando ocupações já existentes, mas também criando alternativas habitacionais mais sustentáveis.

De acordo com Marcelo de Rezende Campos Marinho Couto, a inclusão do direito de laje na legislação cria uma nova modalidade de propriedade imobiliária no Brasil. O direito de laje permite que as construções sobrepostas sejam registradas como unidades imobiliárias autônomas, sem a necessidade de fração ideal do terreno. Essa inovação é especialmente relevante para a realidade urbana brasileira, onde a sobreposição de construções é comum em áreas densamente habitadas. Couto observa que a autonomia e a perenidade são características essenciais do direito de laje, já que possibilitam ao proprietário ceder, de forma onerosa ou gratuita, o espaço aéreo ou o subsolo de sua construção para outra pessoa, que então passa a ter uma unidade distinta da construção-base. Essa dinâmica amplia as possibilidades de aproveitamento do espaço urbano, tornando-o mais eficiente e acessível para diferentes camadas sociais, especialmente em contextos de escassez de terrenos e grande adensamento populacional.

Para o doutrinador Sílvio de Salvo Venosa, o direito de laje, embora represente uma significativa adaptação no sistema de propriedade brasileiro, ainda precisa de regulamentação que facilite a viabilização do registro em áreas de ocupação consolidada. Venosa aponta que o sucesso do instituto depende de uma infraestrutura legal e administrativa que acompanhe a inovação trazida pela lei, a fim de garantir que seu registro traga os benefícios prometidos. Assim, a regulamentação do direito de laje, sem um apoio substancial de políticas habitacionais, pode ser insuficiente para proporcionar uma solução definitiva ao déficit habitacional.

Além disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aborda a aplicabilidade do direito de laje em diferentes contextos, especialmente no que se refere à regularização fundiária. Em um caso recente, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal reconheceu a importância do direito de laje como um mecanismo para regularizar a propriedade em áreas de grande adensamento urbano, destacando a necessidade de assegurar o interesse social e a função social da propriedade. Essa jurisprudência reforça a aplicação do direito de laje em construções que, embora informais, já exercem a função social da propriedade e, portanto, merecem ser reconhecidas e regularizadas juridicamente.

No campo da imissão provisória de posse, o Direito de Imissão Provisória de Posse é um mecanismo que permite que uma parte interessada obtenha posse temporária de um imóvel antes mesmo da conclusão do processo judicial que definirá a propriedade definitiva. Esse direito é especialmente utilizado em desapropriações, nas quais o poder público necessita do imóvel para o desenvolvimento de obras de interesse social ou infraestrutura urbana. A imissão provisória ocorre mediante depósito judicial de um valor prévio que, em tese, compensaria o proprietário pelo uso antecipado da área, buscando equilibrar o interesse público com o direito de propriedade. Essa medida visa agilizar obras e empreendimentos de interesse coletivo enquanto o processo judicial de desapropriação é finalizado.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, em seus estudos sobre o uso de bens públicos, traz uma reflexão crítica sobre o procedimento de imissão na posse. Esse mecanismo permite ao poder público ocupar um imóvel antes do término do processo de desapropriação, visando dar celeridade para atender necessidades públicas urgentes. No entanto, Di Pietro alerta para o risco de que o uso excessivo da imissão na posse, sem que a desapropriação se concretize, transforme uma posse “provisória” em uma ocupação permanente, gerando prejuízo ao proprietário, que muitas vezes não recebe a devida indenização.

Di Pietro destaca o impacto desse procedimento na segurança jurídica, ressaltando que, ao desrespeitar normas que garantem a justa indenização, o poder público cria um cenário de incerteza, onde bens privados podem ser ocupados indefinidamente e sem compensação adequada. A autora defende a aplicação restritiva do instituto, para que o interesse público e o direito de propriedade coexistam de forma equilibrada, respeitando a função social da propriedade.

Adicionalmente, o STJ reafirma que a imissão provisória na posse do imóvel pode ocorrer sem a avaliação prévia ou o pagamento integral, especialmente quando a urgência é demonstrada. Em uma decisão recente, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios reconheceu a possibilidade de imissão provisória de posse, permitindo que o poder público tenha acesso imediato a áreas em condições de urgência, desde que se realize o depósito judicial da indenização. A decisão, que abordou o direito à indenização justa e ao uso do imóvel, estabeleceu que a urgência não pode ser confundida com um processo de desapropriação que prejudique os direitos do proprietário.

Conclusão:

Em síntese, a regulamentação do direito de laje e da imissão provisória de posse evidencia a complexidade das questões habitacionais e da utilização de propriedade pelo poder público. São inovações legislativas importantes, que, contudo, necessitam de uma aplicação cautelosa e de suporte por políticas públicas adequadas. O direito de laje pode ser eficaz na regularização fundiária, mas precisa ser complementado por políticas habitacionais estruturantes, enquanto a imissão provisória de posse exige equilíbrio, respeito à função social da propriedade e à justa indenização, para garantir que os direitos dos cidadãos não sejam prejudicados em nome do interesse público.

Referências:

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direitos Reais. São Paulo: Atlas, 2017.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2016.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Consulta à jurisprudência sobre direito real de laje. Disponível em: https://search.app/epKGzSNrX3h2GzEZA

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Consulta à jurisprudência sobre imissão provisória de posse. Disponível em: https://search.app/A9U928csQhKQDVLw5

COUTO, Marcelo de Rezende Campos Marinho. Direito Real e Registro Imobiliário: Reflexões sobre o Direito de Laje e a Função Social da Propriedade. São Paulo: Atlas, 2020.